59

Foi na livraria do Corte Inglês, aquela junto ao parque de estacionamento (não sei se há lá outra), eu cheio de pressa com o livro de receitas do bacalhauqueralho para oferecer à senhora minha mãe e ela, uma taça de gelatina cheirosa, à minha frente:
- E o livro é bom? E não pode fazer um desconto? É que tem ali alguns maiores, que são mais baratos... É um romance, tem a certeza?
Foda-se!, pensei eu, esta merda não me está a acontecer! 
A mulher da livraria, uma milf toda boa, com uma paciência do camandro a dizer que nunca tinha lido aquele livro, mas as críticas tinham sido boas. Uma aldrabice do caralho!!!, quase gritei pelas órbitas dos olhinhos, boas criticas só se for em casa do Chagas!! aquela merda nem livro parece, parece um tijolo, muitas páginas para justificar o preço, uma capa fofinha para atrair as pestanas rimeladas das ávidas leitoras, e uma histórinha de amor, com sexo animal à mistura (se fosse bem escrito, eu até esgalhava o menino com aquilo, mas não dá, não dá mesmo, a base já vem líquida, não há rumo, nem ritmo, nem merda nenhuma) e muitas gajas e gajos a fingir que são iguais a nós, tudo num português de aviar velhotas.
A querida continuava indecisa, ora olhava para o bacamarte que tinha na mão, ora olhava para as prateleiras. Aposto que se soubesse fazer contas de cabeça, já teria feito o preço à página, para optar pela solução mais vantajosa. Se ao menos o iphone tivesse máquina de calcular, pensaria aquele cerebrozinho amarrotado.
A milf, (mesmo bonita, 'da-se, que morena, que sorriso), a tentar que ela se decidisse, enquanto via a fila de fregueses bufões a crescer. Atrás de mim, um casal aos gritos, mas que merda, discussão de panelas agora??!!?? Passei-me, ceguei até ao olho do cu, dei um passo em frente e cheguei-me mesmo à beirinha da nalgaria da fofa, fingi espreitar por cima do ombro dela, e falei baixinho, no meu tom de voz Bond, James Bond: adoro esse livro, a minha namorada comprou-o no mês passado (não vá a gaja querer fiambre em rolo, melhor mostrar já a indisponibilidade) e eu fiquei fã dessa escritora. Compre sem medo, a sua sobrinha vai adorar... 
Caralho... devia ter tirado uma selfie, só para vos provar como tudo o que aqui escrevo neste 59 é verdadinha pura e dura (mentira, que gente burra não me dá tusa, tava bem mole na altura, mesmo depois de lhe cheirar o creme hidratante do pescoço).
A gaja sorriu-se toda, eu cheguei-me para trás, não fosse ela pensar que eu fazia parte do pack do livrinho de merda, mandou embrulhar, pagou, despediu-se com mais três ou quatro sorrisos convidativos e a milf (caraças, já disse que era linda?) sorriu-me também.  A vida continuou como deve ser, sempreàbrir!



(depois conto como foi a minha vez com a Laura, nome da milf, e o livro de receitas para a senhora minha mãe, que é tão chatínhaaaaaa)

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